20 de novembro de 2006

" Não deixaria meus filhos viajarem"


Sargento do Cindacta 1, de Brasília, diz que pressão que controladores sofrem pode afetar a qualidade do trabalho
Tânia Monteiro

A situação dramática narrada por um dos controladores do Cindacta-1, em Brasília, que preferiu não se identificar para não ser punido, mostra a insegurança que estão sentindo no trabalho. “Eu, hoje, não voaria. Não deixaria minha mulher e meus filhos viajarem (de avião)”, contou o sargento, preocupado e contrariado com a situação que está enfrentando. Tem colega chorando e desmaiando no trabalho por causa da pressão. Tudo reflexo do clima no controle após o acidente do Legacy que se chocou com o Boeing da Gol. O aquartelamento dos controladores pela segunda vez em duas semanas, na véspera do feriado de 15 de Novembro,só piorou a situação. Leia a seguir, trecho de sua entrevista.

PERIGO

“Você teria coragem de deixar sua família viajar de avião sabendo que o clima lá dentro é este? Eu não deixaria minha mulher e meus filhos viajarem. O problema é que a pressão está muito grande e eu ia pensar, será que ele está trabalhando de bem com vida? Será que foi buscado de folga para trabalhar? Será que está passando bem? Estou tendo pesadelos à noite, sonhando com desastre. Acordei sonhando que o avião caía. O outro dia um controlador só viu uma aproximação quando piscou. O que ocorreu com o Gol é o pesadelo de todo controlador. A gente não quer que aconteça, mas estão forçando a barra.”

REFLEXO DO ACIDENTE

“Nove entre dez controladores adoram o que fazem. Têm ideal. Antes, trabalhávamos com mais do que devíamos (além das 14 aeronaves permitidas). Chegamos a 30. Já vi colega trabalhando com 31. O controlador fica mais atento, adrenalina a mil. É até emocionante ver como somos capazes de fazer isso e fazer bem feito, com prudência, com segurança, com competência. Mas antes, não havia essa pressão, essa coação de agora. Depois do acidente, aos poucos, todos foram desabando.”

FOLGA-PRÊMIO

“Conseguir uma folga, que é um direito, se tornou um prêmio. Os controladores vão completar as 144 horas regulamentares do mês a partir da semana que vem. E aí, como vão fazer? Colocar as pessoas para trabalhar ainda mais estressadas do que já estão? Vamos, mais uma vez, ter de fazer relatórios de alerta de perigo.”

CONSTRANGIMENTO

“Estão indo nos buscar em casa. Além de telefonar, vai uma condução buscar. É o maior constrangimento e revolta.”

CHORO

“Vi colegas chorarem. Vi supervisores chorando. Mais de um, sem condições de continuar trabalhando. Mas eles (os chefes) só pensam em números de controladores. Refazem escalas e obrigam as pessoas a trabalhar mesmo que não estejam em condições, sejam psicológicas ou físicas. Ver um supervisor chorar abala. O que mais esses caras querem? (olhos marejados). Querem ver gente morrendo aqui? Porque desmaiando, já vi. É um efeito dominó. E do jeito que estão fazendo, vai caindo um, eles chamam outro, que estava descansando. Agora, até médico está ficando lá dentro. Eles acham que a gente está de frescura. Houve um controlador que ficou internado o dia porque passou mal mas teve de trabalhar à noite porque estava na escala. Outro, tomou soro, injeção no hospital e voltou ao trabalho.”

‘PRISÃO’

“Meu filho viu na televisão que os controladores iam ficar presos no quartel e perguntou pra minha mulher: ‘Por que meu pai está preso? O que ele fez?’”

PLANO

“Plano de reunião tem outro nome: é prisão. Muita gente ficou ali com a roupa do corpo e sem saber por quanto tempo. Será que toda véspera de feriado vai ter aquartelamento? Parece que as chefias pensam que cada pontinho ali (no radar) não é nada. Aquilo não é ‘game over’, que é só começar de novo.”



fonte: www.estadao.com.br

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